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6 de ago. de 2015

A Ferida aberta da Bomba Atômica

Passaram-se sete décadas, mas o tempo ainda não foi suficiente para curar as feridas deixadas pela primeira bomba atômica, detonada em Hiroshima, no Japão, às 8h15 do dia 6 de agosto, uma segunda-feira quente de verão.

"Para garantir que tal sofrimento nuclear nunca ocorra novamente, é preciso apelar não só para o desarmamento, mas para a abolição das armas nucleares", não cansa de repetir Nobuo Miyake, 86, sobrevivente do bombardeio norte-americano.
Naquele dia, Miyake, então com 16 anos, andava de bonde.
Estava a menos de dois quilômetros de distância do hipocentro –o ponto em terra exatamente abaixo da detonação– quando o ataque ocorreu, e só sobreviveu porque decidiu instantaneamente saltar do veículo.
Desde 1980, ele percorre o mundo contando aquilo que define como "inferno na Terra". "Se uma guerra nuclear acontecesse em qualquer lugar hoje, não haveria inimigo ou aliado; o mundo inteiro iria sofrer, e isso levaria à extinção da humanidade", diz o japonês.
Passaram três meses no navio da ONG Peace Boat, que desde 2008 organiza o projeto "Viagem por um mundo sem arma nuclear".
"Já foi levado mais de 150 sobreviventes de Hiroshima e de Nagasaki [onde explodiu a segunda bomba atômica americana, três dias depois] a várias partes do mundo para darem testemunhos e pedirem a abolição nuclear",
"A idade média dos sobreviventes chegou a 80 anos, então, o tempo que resta para eles enviarem essas mensagens urgentes em primeira mão é muito curto".
Por isso, as histórias de sobreviventes já são consideradas relíquias por entidades e autoridades do Japão, que tentam manter esse conhecimento de quem vivenciou a guerra incólume ao tempo.
ESTIGMA
Do pouco mais de um milhão de japoneses classificados como "hibakusha", ou "pessoa afetada pela explosão", cerca de 183 mil estão vivos.
A grande maioria tem mais de 80 anos e luta contra doenças e lesões causadas pelo efeito da bomba de sete décadas atrás.
Por anos os "hibakusha" foram discriminados pelos próprios japoneses, que temiam ser contaminados. Por isso, muitos enterraram suas memórias e se calaram por décadas, escondendo os detalhes do pós-ataque até mesmo da família.
Uma pesquisa do jornal "Asahi" mostrou que 76% dos entrevistados afirmam que a história contada diretamente por estes sobreviventes pode ajudar as gerações mais novas a conter o armamento nuclear.
Desde 2010, a publicação mantém um site com depoimentos.
Em 2011, a empresa jornalística colocou no ar a versão em inglês, com o objetivo de divulgar para o mundo todo as tristes histórias (www.asahi.com/hibakusha/english/).
"Ao compartilhar essas mensagens, é esperado que elas contribuam para a compreensão da realidade que os sobreviventes da bomba atômica ainda enfrentam e para os apelos pela abolição de todas as armas nucleares", diz o site.
CONSTITUIÇÃO PACIFISTA
O apelo, entretanto, contradiz as recentes manobras do governo do premiê Shinzo Abe, que conseguiu a aprovação pela câmara baixa do Parlamento de uma mudança na Constituição pacifista do Japão.
Desde o fim da Segunda Guerra (1939-45), o país estava proibido de participar de ações militares. Mas o premiê defende uma posição mais ousada na área da segurança frente ao crescente poderio militar chinês e às ameaças norte-coreanas.
Para Satoshi Hirose, pesquisador e vice-diretor do Centro de Pesquisas para a Abolição das Armas Nucleares (Recna) da Universidade de Nagasaki, muita gente vê o risco atômico como algo do passado ou restrito a Hiroshima e Nagasaki.
"Mas a ameaça de armas nucleares é um perigo claro e presente para todos os seres humanos".
Por isso, o centro se dedica a promover o desarmamento nuclear e a estudar maneiras de acabar com todas as armas nucleares.
O processo em que o Brasil e a Argentina transformaram sua rivalidade nuclear em cooperação mútua é uma forma de colaboração. Acredita-se que pode ser um dos modelos para o Japão para melhorar sua relação com a China e a Coreia do Norte".
Segundo a instituição Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC), criada em 1991, há hoje 15.700 armas nucleares no mundo. A maioria pertence à Rússia (7.500) ou aos EUA (7.200), seguidos por França (300) e China (250).