Barra Mansa
Há pouco tempo, jovens, negros, entre 14 e 29 anos, que moram em comunidades periféricas da cidade enfrentavam um problema fora da realidade da maior parte das pessoas. Eles não existiam oficialmente. É que a maioria deles ainda não possuía um documento de identificação civil - identidade e CPF -, e em alguns casos, não havia nem mesmo a certidão de nascimento. Isso é o que constatou a ONG Amigos na Cultura (AAA), que desenvolve projetos socioculturais em três bairros do município com baixo índice de Desenvolvimento Humano (IDH) - Paraíso de Cima, Vista Alegre e Getúlio Vargas.
Segundo dados da ONG, mais de 70% dos jovens inscritos em oficinas de cultura e geração de renda do NUFAC (Núcleo de Formação de Agente Cultural da Juventude Negra) - programa do governo federal -, ficaram impedidos de receber a bolsa-auxílio (R$ 100) de que tinham direito. O motivo seria a falta de documentos de identificação.
Por esse problema algumas pessoas têm perdido ou retardado a oportunidade de conseguir um emprego formal, capacitação e até acesso aos programas do governo federal, como por exemplo, o Bolsa Família.
O assistente social da ONG, Samir Gaione de Faria, explicou que esse levantamento foi feito a partir desse embargo.
- Quando a gente começou a fazer as inscrições, precisamos de alguns documentos básicos, até mesmo pela bolsa-auxílio de que eles tinham direito. Então a gente precisava de identidade, CPF, comprovante de residência, para fazer a abertura das contas correntes, na Caixa Econômica, onde seriam depositados esse dinheiro - informou.
De acordo com Samir, dos 200 jovens cadastrados no projeto, nos três bairros, apenas 55 tinham a documentação necessária (CPF, identidade e comprovante de residência).
- Muitos só tinham a certidão de nascimento, e a gente olhava e a data de emissão era de dois, três anos atrás. Nós não sabemos se é porque eles foram registrados somente agora, ou se perderam (os documentos) em chuvas e enchentes, o que é muito comum no Paraíso de Cima, por exemplo - falou, lembrando que muitas pessoas também alegavam não ter dinheiro nem para se deslocar até os postos de identificação civil.
No Paraíso de Cima, ele destacou que também existe a dificuldade em ter um comprovante de residência devido à falta de um endereço oficial, já que algumas famílias moram no assentamento que existe no bairro.
Sem nenhum documento
O assistente social disse que a maior incidência entre os moradores desses bairros era a de não possuir nenhum documento, e que através de pesquisas e questionários eles puderam concluir que essas pessoas só se preocupavam em ter os documentos apenas quando precisavam ingressar no mercado de trabalho, ou quando chegassem à maioridade.
- Muitos não sabiam ou não tinham necessidade e, por isso, não se preocupavam em ter esses documentos. Quando nós perguntávamos quando eles iriam emitir essa documentação eles respondiam que só a partir dos 18 anos, ou quando fossem trabalhar - disse.
Um exemplo disso é a artesã e moradora do Paraíso de Cima, Eliane Aparecida da Silva, de 38 anos. Ela tem cinco filhos e apenas um deles, Matheus, de 14 anos, tem o registro de identidade.
- Eu não tirei porque eu não tenho renda nenhuma. Quando meu telhado voou, molhou todos os documentos, pedi pra defensoria pública, mas ainda não chegou. Agora eu vou tirar os documentos do meu filho mais velho, o César, porque ele não tem registro e necessita - falou ao ser questionada sobre o motivo de não ter emitido a documentação.
Já as irmãs Nathália e Tuani de Almeida Lopes, de 17 e 14 anos respectivamente, também não possuíam documentos de identidade e CPF até o mês passado. Mas, segundo elas, era por motivo da falta de tempo da mãe.
- A gente não tinha feito documento antes porque a minha mãe trabalha. Então, como nós somos menores de idade tínhamos que ir com o responsável. E ela sempre não podia. Mas quando ela teve férias nós fomos - contou Nathália.
Orientação combatendo a desinformação
Após identificarem vários casos, a Amigos na Cultura desenvolveu ações de orientação sobre a importância da documentação na busca pela cidadania.
- A nossa proposta foi realizar um trabalho de conscientização da importância do documento, indo as casas das pessoas, informando e orientando. Além disso, criamos articulações junto a rede do Amigos na Cultura (Detran, Caixa Econômica e outros) para que eles pudessem tirar CPF e RG. Praticamente conduzimos essas pessoas para fazer seus documentos - explicou o presidente da ONG, Marco Aurélio Alves.
Ele salientou que depois desse trabalho, o resultado se mostrou bastante positivo.
- Hoje, alguns meses depois, nós temos um número bem significante de pessoas que tem documento. Praticamente todos os meninos do programa já têm documentação - disse, lembrando que dos 55 que tinham a identificação civil, agora já são 123.
Governo municipal apenas orienta
Gesiane Leonardo, coordenadora de monitoramento e avaliação da Secretária Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, órgão responsável pelos Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), disse que o governo municipal normalmente faz o levantamento dessas áreas vulneráveis e identifica as necessidades da população do local, como por exemplo, a falta de documentos.
Ela lembrou que todas as atividades do Cras se dão a partir do Cadastro Único (CadÚnico) para Programas Sociais do Governo Federal e por isso, pelo menos, uma pessoa da família deve possuir documentos de identificação. Ela explicou que o CadÚnico é um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda para receberem benefícios como o Bolsa Família, tarifa social de energia elétrica, isenção de taxas em concursos públicos, entre outros.
No entanto, ela admitiu que, por vezes, essas pessoas não procuram o Cras - órgão que agiliza e facilita a obtenção de documentos - por questões como: falta de conhecimento e baixo nível de escolaridade.
- Nós trabalhamos com uma rede sócio assistencial, que envolve igrejas, ong's, empresas entre outros parceiros. O nosso papel é de orientar sobre os locais onde os serviços de emissão de documentos são feitos, e também desburocratizar o caminho até eles - comentou.
A advogada Cleuza Maria Ferreira da Silva disse que a lei não prevê nada específico em relação à obtenção da documentação, no entanto, ela orienta que o certo é que antes dos 16 anos todo o cidadão tenha os básicos - identidade e CPF.
- O certo é que pelo menos, até os 16, todo o cidadão brasileiro já tenha os documentos. Mesmo porque são documentos básicos para o ingresso em cursos, empregos - ressaltou.
Há pouco tempo, jovens, negros, entre 14 e 29 anos, que moram em comunidades periféricas da cidade enfrentavam um problema fora da realidade da maior parte das pessoas. Eles não existiam oficialmente. É que a maioria deles ainda não possuía um documento de identificação civil - identidade e CPF -, e em alguns casos, não havia nem mesmo a certidão de nascimento. Isso é o que constatou a ONG Amigos na Cultura (AAA), que desenvolve projetos socioculturais em três bairros do município com baixo índice de Desenvolvimento Humano (IDH) - Paraíso de Cima, Vista Alegre e Getúlio Vargas.
Segundo dados da ONG, mais de 70% dos jovens inscritos em oficinas de cultura e geração de renda do NUFAC (Núcleo de Formação de Agente Cultural da Juventude Negra) - programa do governo federal -, ficaram impedidos de receber a bolsa-auxílio (R$ 100) de que tinham direito. O motivo seria a falta de documentos de identificação.
Por esse problema algumas pessoas têm perdido ou retardado a oportunidade de conseguir um emprego formal, capacitação e até acesso aos programas do governo federal, como por exemplo, o Bolsa Família.
O assistente social da ONG, Samir Gaione de Faria, explicou que esse levantamento foi feito a partir desse embargo.
- Quando a gente começou a fazer as inscrições, precisamos de alguns documentos básicos, até mesmo pela bolsa-auxílio de que eles tinham direito. Então a gente precisava de identidade, CPF, comprovante de residência, para fazer a abertura das contas correntes, na Caixa Econômica, onde seriam depositados esse dinheiro - informou.
De acordo com Samir, dos 200 jovens cadastrados no projeto, nos três bairros, apenas 55 tinham a documentação necessária (CPF, identidade e comprovante de residência).
- Muitos só tinham a certidão de nascimento, e a gente olhava e a data de emissão era de dois, três anos atrás. Nós não sabemos se é porque eles foram registrados somente agora, ou se perderam (os documentos) em chuvas e enchentes, o que é muito comum no Paraíso de Cima, por exemplo - falou, lembrando que muitas pessoas também alegavam não ter dinheiro nem para se deslocar até os postos de identificação civil.
No Paraíso de Cima, ele destacou que também existe a dificuldade em ter um comprovante de residência devido à falta de um endereço oficial, já que algumas famílias moram no assentamento que existe no bairro.
Sem nenhum documento
O assistente social disse que a maior incidência entre os moradores desses bairros era a de não possuir nenhum documento, e que através de pesquisas e questionários eles puderam concluir que essas pessoas só se preocupavam em ter os documentos apenas quando precisavam ingressar no mercado de trabalho, ou quando chegassem à maioridade.
- Muitos não sabiam ou não tinham necessidade e, por isso, não se preocupavam em ter esses documentos. Quando nós perguntávamos quando eles iriam emitir essa documentação eles respondiam que só a partir dos 18 anos, ou quando fossem trabalhar - disse.
Um exemplo disso é a artesã e moradora do Paraíso de Cima, Eliane Aparecida da Silva, de 38 anos. Ela tem cinco filhos e apenas um deles, Matheus, de 14 anos, tem o registro de identidade.
- Eu não tirei porque eu não tenho renda nenhuma. Quando meu telhado voou, molhou todos os documentos, pedi pra defensoria pública, mas ainda não chegou. Agora eu vou tirar os documentos do meu filho mais velho, o César, porque ele não tem registro e necessita - falou ao ser questionada sobre o motivo de não ter emitido a documentação.
Já as irmãs Nathália e Tuani de Almeida Lopes, de 17 e 14 anos respectivamente, também não possuíam documentos de identidade e CPF até o mês passado. Mas, segundo elas, era por motivo da falta de tempo da mãe.
- A gente não tinha feito documento antes porque a minha mãe trabalha. Então, como nós somos menores de idade tínhamos que ir com o responsável. E ela sempre não podia. Mas quando ela teve férias nós fomos - contou Nathália.
Orientação combatendo a desinformação
Após identificarem vários casos, a Amigos na Cultura desenvolveu ações de orientação sobre a importância da documentação na busca pela cidadania.
- A nossa proposta foi realizar um trabalho de conscientização da importância do documento, indo as casas das pessoas, informando e orientando. Além disso, criamos articulações junto a rede do Amigos na Cultura (Detran, Caixa Econômica e outros) para que eles pudessem tirar CPF e RG. Praticamente conduzimos essas pessoas para fazer seus documentos - explicou o presidente da ONG, Marco Aurélio Alves.
Ele salientou que depois desse trabalho, o resultado se mostrou bastante positivo.
- Hoje, alguns meses depois, nós temos um número bem significante de pessoas que tem documento. Praticamente todos os meninos do programa já têm documentação - disse, lembrando que dos 55 que tinham a identificação civil, agora já são 123.
Governo municipal apenas orienta
Gesiane Leonardo, coordenadora de monitoramento e avaliação da Secretária Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, órgão responsável pelos Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), disse que o governo municipal normalmente faz o levantamento dessas áreas vulneráveis e identifica as necessidades da população do local, como por exemplo, a falta de documentos.
Ela lembrou que todas as atividades do Cras se dão a partir do Cadastro Único (CadÚnico) para Programas Sociais do Governo Federal e por isso, pelo menos, uma pessoa da família deve possuir documentos de identificação. Ela explicou que o CadÚnico é um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda para receberem benefícios como o Bolsa Família, tarifa social de energia elétrica, isenção de taxas em concursos públicos, entre outros.
No entanto, ela admitiu que, por vezes, essas pessoas não procuram o Cras - órgão que agiliza e facilita a obtenção de documentos - por questões como: falta de conhecimento e baixo nível de escolaridade.
- Nós trabalhamos com uma rede sócio assistencial, que envolve igrejas, ong's, empresas entre outros parceiros. O nosso papel é de orientar sobre os locais onde os serviços de emissão de documentos são feitos, e também desburocratizar o caminho até eles - comentou.
A advogada Cleuza Maria Ferreira da Silva disse que a lei não prevê nada específico em relação à obtenção da documentação, no entanto, ela orienta que o certo é que antes dos 16 anos todo o cidadão tenha os básicos - identidade e CPF.
- O certo é que pelo menos, até os 16, todo o cidadão brasileiro já tenha os documentos. Mesmo porque são documentos básicos para o ingresso em cursos, empregos - ressaltou.
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