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6 de mar. de 2012

Colonização da África ajudou a disseminar Aids

Pesquisa usa a genética moderna para traçar a história do vírus HIV

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Comércio de marfim na África e colonização ajudaram a espalhar Aids
Foto: Washington Post
Comércio de marfim na África e colonização ajudaram a espalhar Aids Washington Post
RIO - A colonização da África foi fundamental para espalhar a Aids, dizem o jornalista Craig Timberg e o pesquisador Daniel Halperin. Além de uma reportagem publicada no jornal “Washington Post”, eles são os autores do livro “Tinderbox: How the West Sparked the AIDS Epidemic and How the World Can Finally Overcome it” (em tradução livre, barril de pólvora: como o Ocidente provocou a epidemia de Aids e como o mundo pode finalmente enfrentá-la) , de 432 páginas, publicado nos Estados Unidos nesta quinta-feira pela Penguin Press. Eles lançaram mão de descobertas genéticas recentes para traçar como ocorreu a propagação deste vírus.
Cientistas acreditam que o primeiro caso ocorreu em uma área de floresta densa no sudeste de Camarões, por volta de 1900. Um caçador teria se alimentado de um chimpanzé infectado, permitindo que o vírus passasse do sangue do animal para o corpo do homem, provavelmente através de uma ferida aberta durante o abate.
A colonização da África, porém, foi fundamental para disseminar a doença. Matas nunca antes exploradas passaram a receber expedições com colonizadores e milhares de carregadores africanos, que realizavam serviço forçado. Isto ocorreu justamente no berço da epidemia de Aids, no momento em que houve a transmissão do vírus do chipanzé para o homem, quando a cepa chamada HIV-1 grupo M apareceu pela primeira vez. Este vírus tem sido responsável por 99% das mortes de Aids em todo mundo, não apenas na África, mas também em Moscou, Rio de Janeiro, São Francisco, Nova York, Washington. Antes, porém, a circulação do HIV-1 grupo M era restrita a uma comunidade de chimpanzés concentrada em Camarões.
Uma equipe de pesquisadores liderada por Beatrice Hahn, da Universidade do Alabama, e Sharp Paul, da Universidade de Edimburgo, desenvolveu um projeto para identificar o vírus em fezes de chimpanzés recolhidas numa vasta área ao sul de Camarões. Eles são muito parecidos com a forma de HIV que circula em humanos.
Para identificar o vírus que circula em símios, pesquisadores montaram dez estações de pesquisa no país, duas delas em áreas remotas do sudeste. Justamente nelas, a equipe de Hahn e Sharp colheu amostras do vírus símio, que era quase identico ao HIV-1 do grupo M. Esta pesquisa foi publicada na revista “Science” em 2006.
A descoberta deu largada a uma corrida entre cientistas para revelar a data em que o vírus infectou uma pessoa. A análise de uma amostra de sangue preservada desde 1959 comprovou que o HIV já circulava em Kinshasa, capital do Congo, muito antes de chamar a atenção internacionalmente, na década de 1980. Outro trabalho, publicado na “Nature” em 2008 pelo biólogo Michael Worobey, analisou outra amostra do vírus, de 1960.
Ao comparar geneticamente as duas amostras em um laboratório da Universidade do Arizona, Worobey pôde determinar que o HIV-1 grupo M era muito mais antigo do que se imaginava. Ambas as amostras do vírus pareciam ter descendido de um único ancestral em algum momento entre 1884 e 1924. A data mais provável era 1908.
A teoria é que o vírus passou dos chimpanzés para o homem. E uma única pessoa infectada levou o HIV até Kinshasa. A cidade fora fundada por belgas em 1881, quando potências coloniais dividiram o continente em áreas de influência. Até o início do século 20, Kinshasa, então chamada Leopoldville, foi a maior cidade da África Central. Esta cidade teria sido fundamental para a explosão da epidemia.
Os cientistas que estudam o HIV-1 grupo M já encontraram muitas variedades, chamados de subtipos, cada um com estruturas genéticas um pouco modificadas, em vários locais do planeta. Mas a extensa árvore genealógica do vírus indica que todos eles devem ter se espalhado a partir de um único caso, cujo marco zero foi a cidade de Kinshasa.
O comércio internacional, sobretudo de marfim e de borracha, movimentava na África grandes contingentes de trabalhadores nativos escravizados. Além disso, as rotas comerciais no interior usavam os rios Ngoko, Sangha e Congo, próximo aos locais em que o vírus da Aids que circula em humanos acabara de nascer.
Os carregadores de mercadorias, que chegavam a transportar 55 quilos cada um, sendo que muitas vezes mais de mil pessoas por dia eram mobilizadas, enfrentavam doenças como tripanossomíase africana (doença do sono), varíola e infecções na pele. O compartilhamento de agulhas nas vacinações da época não era raro.
A sífilis, trazida pelos europeus, também era um problema. Esta doença sexualmente transmissível mostra que as interações sexuais, muitas delas forçadas, tiveram papel importante na disseminação inicial da Aids.
Pesquisadores ressaltam que pode ter havido outra transmissão de Aids de chimpanzés para pessoas antes deste caso estudado. Mas a região tinha pouco contato com o mundo exterior, dificultando sua propagação. Para difundir amplamente o HIV, é necessário haver uma população relativamente grande. Além disso, é necessário uma cultura sexual em que as pessoas muitas vezes têm mais de um parceiro. Isso ocorreu em Kinshasa. Ali a Aids virou uma epidemia.
As circunstâncias históricas que levaram à disseminação da Aids só foi possível entre 1880 e 1920. Este foi o período em que os rios eram importantes rotas comerciais e os preços globais da borracha eram atrativos. Com a queda do valor desta commoditie no mercado internacional e com a criação de estradas de ferro, na década de 1920, o ritmo do movimento humano pela região diminuiu. E, sem “A Partilha de África” por europeus, seria difícil ver como o HIV poderia ter conseguido sair de Camarões.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/ciencia/colonizacao-da-africa-ajudou-disseminar-aids-4112292#ixzz1oLMkRobk
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